Governança Tributária do Futuro: Como Estados e Municípios Vão Dividir Poder, Receita e Decisões no Novo IBS

17/11/2025
A integração entre estados e municípios será a base da nova governança do IBS, que promete um sistema tributário mais moderno, transparente e alinhado ao consumo em todo o Brasil.
A integração entre estados e municípios será a base da nova governança do IBS, que promete um sistema tributário mais moderno, transparente e alinhado ao consumo em todo o Brasil.

Introdução

O Brasil está prestes a viver uma das maiores transformações da história do seu sistema de arrecadação. A criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que unificará tributos estaduais e municipais, inaugura uma era de desafios profundos e oportunidades inéditas. No centro dessa nova engrenagem está uma pergunta que ressoa entre gestores públicos, advogados tributaristas e empresas de todo o país: como será a governança do novo sistema?

O tema não é simples — envolve poder político, autonomia federativa, segurança jurídica e a promessa de uma tributação mais eficiente. O desenho institucional do futuro órgão gestor do IBS, as regras de partilha da arrecadação e o funcionamento do contencioso administrativo formarão o tripé que sustentará o sucesso (ou o fracasso) dessa nova fase. E é exatamente esse debate que está ganhando força, dia após dia, na agenda nacional.

O Desafio da Governança: Quem Decide o Quê no Novo IBS

A governança do IBS será o coração do novo sistema. Afinal, estamos falando de um imposto único, gerido de maneira conjunta por estados e municípios — dois entes federativos historicamente marcados por disputas políticas, desigualdades econômicas e interesses próprios.

Embora a proposta final ainda esteja em construção, especialistas apontam que o Brasil caminha para a criação de um Comitê Gestor Nacional, modelo inspirado em sistemas internacionais de IVA. Esse comitê deverá concentrar funções que vão desde o cadastro único de contribuintes até a operacionalização das regras de alíquota, fiscalização e arrecadação.

O desafio é monumental:

  • Garantir autonomia federativa, sem comprometer a unidade do sistema.
  • Evitar disputas políticas que travem decisões essenciais.
  • Assegurar eficiência operacional, para que estados e municípios recebam os valores devidos em tempo real.
  • Oferecer previsibilidade e segurança jurídica às empresas, que terão um único imposto, mas com múltiplos beneficiários.

Um ponto sensível é a governança compartilhada: estados e municípios precisam estar representados de forma equilibrada, sem que um lado domine o outro. É necessário assegurar paridade decisória, mecanismos de voto transparente e critérios técnicos para evitar que o comitê se torne refém de tensões políticas.

Em resumo, a governança do IBS será o teste definitivo da capacidade federativa brasileira de cooperação.

Partilha da Arrecadação: O Jogo de Equilíbrio Entre Receita e Justiça Tributária

Se a governança é o coração, a partilha da arrecadação é o sangue que circula pelo sistema. A principal promessa do IBS é a adoção do princípio do destino: a receita será destinada ao local onde ocorre o consumo, não à origem da produção. Trata-se de uma mudança histórica.

Mas como garantir que estados produtores não sofram perdas abruptas? E como assegurar que municípios pequenos e dependentes de transferências não fiquem ainda mais vulneráveis?

A resposta passa por três pilares essenciais:

1. Transição gradual e previsível

A reforma prevê uma migração escalonada das receitas, de forma a permitir que entes federativos se adaptem. Essa transição é vital para manter serviços públicos funcionando e equilibrar realidades muito diferentes entre regiões do país.

2. Sistema de compensações

Estados com vocação industrial temem perder arrecadação. Para isso, mecanismos de compensação temporária devem ser acionados para evitar desequilíbrios bruscos e garantir que toda a federação avance de maneira harmônica.

3. Distribuição automática, rastreável e transparente

Com a tecnologia atual, é possível que o comitê gestor realize, praticamente em tempo real, a distribuição da receita entre estados e municípios conforme alíquotas, volumes de consumo e demais critérios objetivos.

Isso reduz a burocracia, corta disputas sobre créditos e minimiza renúncias fiscais — um ambiente mais saudável para o desenvolvimento econômico.

A eficiência da partilha será medida não apenas pela velocidade da distribuição, mas pela sua justiça. Quanto maior a transparência, maior a confiança no sistema.

O Novo Contencioso Administrativo: Agilidade, Técnica e Uniformidade Nacional

A criação do IBS exige também um novo contencioso administrativo tributário, capaz de absorver conflitos decorrentes da aplicação do tributo. Hoje, cada estado e cada município tem suas próprias instâncias e procedimentos. Com o IBS, esse cenário pulverizado precisa se transformar.

O objetivo é construir um sistema que tenha:

1. Julgamento técnico e especializado

O IBS envolve uma lógica mais parecida com experiências internacionais de IVA. Isso exige julgadores com alta formação técnica, evitando distorções, excessos interpretativos e decisões contraditórias.

2. Uniformidade de entendimento

Empresas que atuam nacionalmente não podem enfrentar 27 interpretações diferentes para a mesma regra. A uniformização do contencioso será decisiva para garantir segurança jurídica e previsibilidade.

3. Processo administrativo com prazos curtos

Litígios que se arrastam por anos não atendem a ninguém — nem estados, nem municípios, nem contribuintes. Um sistema mais ágil, com instâncias claras e digitalizadas, melhora o ambiente de negócios e reduz custos operacionais.

4. Transparência absoluta

A publicação de súmulas, precedentes e estatísticas de julgamentos cria um ambiente de responsabilidade institucional e reduz margem para arbitrariedades.

O novo contencioso deve nascer moderno, rápido e confiável. Se for bem estruturado, poderá ser um dos maiores avanços da reforma, contribuindo para a pacificação das relações entre Fisco e contribuinte.

Conclusão: Um Sistema Tributário que Precisa Respirar União, Técnica e Confiança

O sucesso da reforma tributária não será medido apenas pela criação do IBS, mas pela forma como ele será administrado. Governança sólida, partilha justa e um contencioso eficiente formam a tríade necessária para que estados, municípios e contribuintes possam coexistir num modelo mais moderno, simples e transparente.

O Brasil está diante de uma oportunidade histórica de reconstruir sua relação com os tributos — e isso exige liderança, diálogo e visão de futuro.

Se a governança do IBS realmente nascer com equilíbrio, técnica e transparência, abriremos as portas para uma nova fase em que o país finalmente conseguirá superar o labirinto tributário que o acompanhou por décadas.

O convite está lançado: participe, debata, reflita. A reforma é de todos nós.




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